O projeto de reconstrução do Santos tem ocupado os dias e as noites de Marcelo Teixeira. Eleito presidente do clube da Vila Belmiro em dezembro do ano passado, dias após o rebaixamento inédito para a Série B do Campeonato Brasileiro, o cartola tem deixado os negócios da família de lado para focar na resolução dos urgentes problemas do Peixe.
Nesta entrevista exclusiva ao ge, o dirigente passa a limpo os atos de suas primeiras semanas de gestão, detalha a delicada situação financeira do Santos, alega um rombo de R$ 65 milhões deixado pelo seu antecessor Andres Rueda, explica a negociação por um novo patrocinador máster em um contrato que pode chegar a R$ 135 milhões e adota cautela no plano de repatriar o atacante Neymar.
“Hoje tenho sonhos mais rápidos para concluir (risos), sonhos que são necessários.”
O dirigente também falou sobre o andamento das negociações com a WTorre pela construção da Nova Vila Belmiro e não descartou a possibilidade de o Santos buscar um outro terreno na Baixada para levantar sua arena.
A entrevista com Marcelo Teixeira ocorreu na última sexta-feira (16) na sala da presidência dentro da Vila Belmiro. O bate-papo durou aproximadamente uma hora, e o presidente do Santos pediu calma aos torcedores. Segundo o próprio, o equilíbrio virá apenas no “médio prazo”.
Sala de Marcelo Teixeira na Vila Belmiro com fotos da esposa e dos filhos Carolina e Marcelo — Foto: Ana Canhedo
Não depende de nós. O Santos acompanha de perto a situação do Neymar. Ele tem contrato de dois anos com o Al-Hilal (válido até 30 de junho de 2025), houve a fatalidade da contusão e não sei se ele ampliará o contrato. Na conversa que tive com o Neymar entendi que é possível uma extensão. Se isso acontecer, deve ser pelo tempo que ele ficou parado. Estamos acompanhando essas tratativas e essas negociações para saber quando ele ficará livre para resolver sua situação, sua volta ao Brasil. Se for o caso, antes disso, a gente desenha um projeto de retorno dele ao Brasil. Não depende apenas do Santos, depende também da vontade do jogador.
O senhor esperava tantas vitórias neste início de temporada?
— Tinha um sentimento positivo porque em todo o momento nós agimos sentindo a reciprocidade daqueles que estavam sendo contratados, a gente percebia o comprometimento. Os atletas, uns mais experientes, outros mais jovens, entenderam o projeto e os dois degraus que temos em 2024: o Paulistão e a Série B do Campeonato Brasileiro. O primeiro objetivo é ir bem no Paulista e chegarmos à decisão, e o segundo é fazer com que o Santos tenha um bom desenvolvimento em uma competição totalmente atípica para nós que é a Série B. Boa parte dos atletas nunca jogaram, é um desafio para nós, algo totalmente diferente daquilo que é a história do Santos.
— Tinha um bom pressentimento sobre aquilo que poderíamos alcançar no curto prazo pelo perfil dos nossos atletas: nomes de alto nível e capacidade técnica. Me atrevo a dizer que, se tivéssemos um elenco assim em anos anteriores não estaríamos na situação em que estamos no aspecto esportivo. Não há entusiasmo, não há euforia, mas há tranquilidade para que o clube possa seguir um caminho neste trabalho para alcançar seus objetivos e metas.
Marcelo Teixeira em entrevista exclusiva ao ge — Foto: Ana Canhedo
Depois da classificação às quartas do Paulistão, o Carille colocou o Santos como uma das forças a serem batidas no estadual. O senhor coloca o Peixe como favorito ao título do Paulistão?
— Acho que tem trabalhos à frente do Santos hoje, até pelo tempo. O futebol não é uma ciência exata que diga que há tempo e prazo para alcançar um objetivo. Isso pode acontecer de forma bem rápida, desde que tudo esteja sendo feito da maneira como estamos planejando. O resultado vem correspondendo porque estamos fazendo por merecer o objetivo. Lá no início da temporada, quando conversei com os jogadores no CT, o objetivo apresentado foi alcançar a classificação às quartas. A segunda meta era disputar o título.
Santos venceu clássicos contra Corinthians e São Paulo neste Paulistão — Foto: Marcos Ribolli
Qual o peso do “fator Fábio Carille” neste bom começo de temporada no Santos?
— Tenho por filosofia evitar a troca de profissionais. No início da minha gestão, focamos em dois nomes que consideramos técnicos de uma nova geração. O primeiro (Thiago Carpini, hoje no São Paulo) fizemos um contato, ficamos próximos de um acerto e, concomitante, buscamos o Carille. No desenvolvimento das conversas senti mais firmeza no Carille, que já teve uma passagem pelo Santos, um currículo vencedor e possui a tendência de se firmar no clube na busca dos objetivos traçados para 2024.
— Para todos, elenco e comissão técnica, temos duas fases nesses contratos profissionais. Há metas e objetivos para a temporada 2024 e temos as renovações automáticas exatamente quando alcançarmos os nossos objetivos. O Santos está em um momento onde não deve estar, disputando algo que não estamos acostumados. Todos temos consciência de que devemos colocar o Santos em seu devido local. Reconduzido, automaticamente, este plantel tem a tendência de permanência no Santos para a temporada 2025. Temos o planejamento de metas, em termos de prêmios e objetivos, para o ano que vem. Tudo está traçado para as duas próximas temporadas.
Fábio Carille dá autógrafo em camisa de torcedor do Santos — Foto: Raul Baretta/Santos
O V-Varen Nagasaki, ex-clube do Carille, entrou com ação na Justiça cobrando a multa rescisória pela quebra do contrato. O Santos foi notificado?
— O Santos praticamente já disse tudo. Vamos acompanhar o caso. Até o momento, não recebemos nada da Fifa e, se recebermos algo, o departamento jurídico colocará os documentos de acordo com as exigências que serão necessárias.
Uma das primeiras ações do senhor como presidente do Santos foi resolver a questão de salários e direitos trabalhistas atrasados. Pelas informações que chegaram a nós, os contratos CLT foram pagos para evitar processos trabalhistas. Hoje, ainda há pendências do passado em aberto? Os direitos de imagem estão em dia?
— Apenas da temporada anterior temos um buraco de R$ 65 milhões. É um volume e uma situação gravíssima. Não tenho esse perfil como gestor de lamentar e ficar falando do passado. Temos essa realidade e agora temos que buscar soluções para encontrarmos recursos financeiros para saldarmos esse compromisso. Temos a prioridade de saldar os compromissos salariais e os impostos, temos também tido, por parte dos credores, uma certa tolerância e paciência. O departamento financeiro e jurídico têm sido claros para saldar esses compromissos dentro do diálogo.
— O objetivo é saldar essas dívidas. Paralelamente a isso, o Santos busca aumentar suas receitas mesmo com a queda para a Série B. Temos o agravante de termos o orçamento diminuído pela metade por conta do rebaixamento. Se tivéssemos ficado em 16º no Brasileirão do ano passado, teríamos uma premiação a receber. Não recebemos nada e ficamos com cota diminuída. É uma matemática difícil para equilibrar as despesas. Estamos trabalhando para que o Santos encontre, no médio prazo, um equilíbrio.
Na última vez que o senhor falou publicamente sobre a folha salarial do clube, o valor era de R$ 7,7 milhões com o elenco principal e mais R$ 1,7 milhão com os atletas do chamado “Grupo B”. De lá para cá, dois jogadores deixaram o clube (Lucas Lima e o Mendoza) e houve a renegociação com o Morelos. Hoje, qual o valor total da folha?
— Em 2023, considerando encargos, tínhamos uma folha de aproximadamente R$ 20 milhões. Hoje, nossa folha está na casa dos R$ 8 milhões. Essa é a meta a ser alcançada. É um valor relativamente alto para a disputa da Série B. Pretendíamos que a folha estivesse, no máximo, entre R$ 5 milhões e R$ 6 milhões, mas havia sempre não só a necessidade de reposição de um novo elenco, o que foi feito de forma muito rápida, como também negociarmos jogadores que estavam no ano passado. Esses valores ainda estão dentro da própria folha salarial. O Santos continua assumindo parte dos vencimentos dos salários (jogadores emprestados) e outros ainda permanecem no clube.
Lucas Lima foi emprestado ao Sport — Foto: Marlon Costa/Pernambuco Press
Esse é o valor estabelecido como teto para a temporada?
— O Santos permanecerá dentro desse nível. O que pode acontecer é que no Paulistão, que é um campeonato laboratório, possa haver uma reposição, uma possível troca de peças visando a disputa do Campeonato Brasileiro, mas nunca saindo do patamar e do nível que temos hoje.
O Santos tem na mesa uma proposta de uma casa de apostas pelo patrocínio máster, espaço que hoje é ocupado pela Blaze. Como andam as negociações?
— O Santos está valorizando bastante esse momento, apesar de disputar apenas duas competições no ano. No Brasileirão, a principal competição da temporada, o Santos terá uma visibilidade muito grande. Essa visibilidade tem sido um foco, um ponto vantajoso e positivo para o departamento de marketing trabalhar com o mercado. O mercado tem nos respondido bem. Hoje, o patrocinador máster da camisa é a Blaze e nós queremos esgotar todas as possibilidades para a permanência deles. Seja a permanência ou a possível rescisão, se necessário. É neste estágio que estamos indo.
— Temos propostas paralelas, mas por respeito ao contrato com os parceiros, estamos priorizando quem já está no Santos. A Binance, por exemplo, entendeu o projeto e nós valorizamos uma propriedade da camisa que até então era outra no ano passado. Nós renegociamos e colocamos o parceiro em uma propriedade de maior destaque. É assim que estamos trabalhando. Todas as negociações são no nível que a gente pretende para o Santos nessa temporada de 2024. Não basta ser apenas para uma temporada, mas precisa ser de, no mínimo, de dois anos. Vamos esgotar a Blaze e temos um prazo limite, estipulado para o departamento de marketing, para que haja a negociação. Vamos definir uma ou outra.
O valor dessa proposta da casa de apostas para o espaço máster da camisa chega em R$ 130 milhões?
Chega em R$ 135 milhões (risos). São valores por metas, por objetivos alcançados. Há um fixo e depois são metas a serem alcançadas pelo clube.
Jogadores do Santos posam com camisa do novo patrocinador do clube — Foto: Raul Baretta/ Santos FC
O senhor citou um determinado prazo para o departamento de marketing nas negociações com a Blaze. Qual é o prazo?
— Não sei te falar a data certa agora, mas estamos bem perto do nosso limite máximo. Está muito próximo, não me lembro agora se foi no fim desse mês, mas te garanto que estamos muito próximos. Eles (Blaze) mesmos ofereceram uma data, está próximo. Teremos novidades em breve.
Há um certa precaução nessa negociação delicada com a Blaze para não arranhar a relação do Santos com a família Neymar?
— Tratamos de uma maneira profissional. Não tratamos de uma forma que agrade a um ou a outro. Se o contrato é profissional, nós vamos mostrar as vantagens e desvantagens e o clube decidirá independentemente de qualquer relação. O departamento está sendo muito claro nas negociações, não sei se estão conversando com o Neymar pai. Quando tivermos uma definição pode até ser que haja uma conversa para esclarecermos sobre o que tem acontecido.
Neymar no vestiário do Santos no espaço reservado ao Rei Pelé — Foto: Reprodução/Santos
O clube tem um transfer ban para resolver. Os representantes do Fabián Bustos nos dizem que não foram procurados pelo Santos para resolver a questão e, enquanto isso, o impedimento de registro de novos jogadores segue ativo. Como o clube pretende pagar os R$ 4 milhões?
— O primeiro contato foi feito pelo Marcelo Fernandes (auxiliar técnico). O Bustos explicou que não estava mais na esfera dele, que já havia esgotado as conversas com a gestão anterior e havia entregado nas mãos dos advogados. O nosso jurídico está em contato com o Bustos, mas não obtivemos uma resposta. Não sei qual é a dificuldade, me parece que é por falta mesmo de um retorno. Eles disseram a vocês que não houve o contato do Santos, mas o Santos tem feito as tentativas de contato. Queremos resolver, a única alternativa viável seria o parcelamento. Este é o entrave que existe. Continua o transfer ban. Não podemos assumir um compromisso hoje deste valor, assim como também não assumiria outro que não cumpriria. Estamos propondo de forma aberta, até mesmo para que o Santos possa cumprir. Não adianta insistir em um pagamento à vista, é um problema sério, isso nos prejudica muito.
O Santos tem um acordo assinado com a concessionária que administra o Pacaembu para jogar em São Paulo na temporada 2024. Quantas partidas o clube pretende fazer por lá?
— Existe um número previsto em contrato, mas agora não me lembro. No contrato há alguns acordos, como o número de jogos, o match day no estádio e a possibilidade de levarmos, caso haja a demolição da Vila para a construção de uma nova arena, o Memorial de Conquistas para o Pacaembu. Existem alternativas, estamos aguardando porque havia uma previsão de inauguração que precisou ser adiada.
Marcelo Teixeira, presidente do Santos, e Eduardo Barella, CEO da concessionária Allegra Pacaembu, posam com bandeira do Peixe — Foto: Divulgação
— Estamos acompanhando o processo e tudo está muito bem encaminhado, principalmente caso o Santos venha a não ter mais a Vila Belmiro. Se isso acontecer, teremos definido o Pacaembu como segunda casa. Não que isso signifique que o Santos não jogaria em outros lugares, temos agora um jogo no Morumbis (domingo, 25 de fevereiro, contra o São Bernardo). Há uma abertura grande com o presidente Casares, uma relação boa, nos conhecemos há muito tempo, acredito que temos outras possibilidades, não apenas o Pacaembu.
Na primeira semana de janeiro, o Santos exerceu o direito de compra do CT Rei Pelé junto à SPU. Qual será o custo dessa operação?
— A avaliação do laudo atualizado está em aproximadamente R$ 75 milhões. Foi o laudo apresentado e é o laudo que estamos anexando no processo de compra.
Qual o modelo de pagamento?
— Por enquanto, não chegamos nesse acordo. Há um acompanhamento por parte da presidência da República, através do vice-presidente Geraldo Alckimin, também através da SPU (Secretaria de Patrimônio da União) e ministra Esther Dweck (responsável pela pasta de Gestão e inovação em Serviços Públicos). Estamos respeitando os trâmites dentro da lei. O Santos já exerceu o direito de compra, recebeu por parte da SPU a necessidade da exigência da atualização do laudo e já entregamos o documento. O prazo era até março de 2024, o Santos se adiantou e já entregou o documento. O processo está em andamento.